UM COMPOSITOR LUSITANO NO MARANHÃO IMPERIAL
Professor Adjunto da Universidade Federal do Piauí
O presente estudo trata de questões referentes ao compositor português António Luiz
Miró e sua passagem pelo Maranhão na primeira metade do século XIX. Faz parte de um
projeto desenvolvido no Núcleo de Pesquisa em Música, da Universidade Federal do Piauí
sob minha coordenação, em que se pretende realizar edições musicais da obra do composi-
tor para um exame analítico de sua feitura composicional, além de tratar de questões refe-
rentes às relações luso-brasileiras no século XIX. Tem, também a preocupação com a for-
mação de discentes pesquisadores nos programas de iniciação científica, objetivando o
desenvolvimento da pesquisa junto ao Departamento de Arte desta instituição.
Palavras-chave: musicologia histórica; edição musical; António Luiz Miro Abstract: The present study is about referring subjects to the composer Portuguese António Luiz Miró and its passage for Maranhão in the first half of the century XIX. It is part of a project developed in the Nucleus of Research in Music, of the Federal University of Piauí under my coordination, in that intends to accomplish musical editions of the com-poser's work for an analytic exam of its making compositional, besides negotiating of re-ferring subjects to the Portuguese and Brazilian relationships in the century XIX. Has also the concern with the formation of searching students in the programs of scientific initiati-on, objectifying the development of the research close to the Department of Art of this ins-Key-words: historical musicology; musical edition; António Luiz Miró Introdução
Este texto apresenta resultados de estudos que tenho desenvolvido sobre relações mu-
sicais luso-brasileiras, particularmente sobre compositores portugueses que atuaram em
São Luís do Maranhão na primeira metade do século XIX.
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Nas pesquisas que realizo sobre a prática musical no Maranhão Imperial, aflorou a fi-
gura do pianista e compositor António Luiz Miró (1815-1849), um personagem ainda re-
pleto de lacunas na história da música portuguesa e brasileira. Compositor de origem espa-
nhola chegou a Portugal com seu pai, que se estabeleceu em Lisboa, aonde veio a atuar
destacadamente nesta cidade como concertista, operista e diretor dos teatros de maior des-
Em fins da primeira metade do século XIX aportou em São Luís do Maranhão, acom-
panhado de sua esposa Josefina, para exercer as atividades de diretor do Teatro São Luís
destacando-se, também, como professor de piano.
Esta pesquisa, em fase de andamento, procurará trazer à luz informações sobre este
compositor e sua atividade musical em Lisboa e São Luís do Maranhão, com principal ên-
fase em sua obra, motivo de um projeto mais amplo de estudos musicológicos junto ao
Núcleo de Pesquisa em Música da Universidade Federal do Piauí, objetivando a ampliação
dos horizontes da musicologia nacional e ibero-americana, e contribuindo para ampliar a
leitura musical das relações luso-brasileiras e de um maior enriquecimento da temática que
desenvolvo no campo da pesquisa musicológica: a produção musical do século XIX em
O Compositor
António Miró chegou ao Maranhão por volta de 1850. Tomás Borba em seu Dicioná-rio o dá como natural de Granada, onde nasceu em 25 de agosto de 1815, falecendo em
“Pianista e compositor espanhol. Veio para Portugal muito novo, na altura em que seu
pai, logo após o fim da Guerra Peninsular, se estabeleceu em Lisboa. Nesta cidade foi dis-
cípulo de Domingos Bomtempo e de Frei José Marques, começando por ganhar fama de
excelente pianista. Foi porém como compositor teatral que alcançou maior nomeada. No
Teatro das Laranjeiras, no Teatro de S. Carlos, no D. Maria e no Ginásio representaram-se
algumas peças musicadas da sua autoria, como d “drama lírico” Os infantes de Ceuta, so-
bre texto de Alexandre Herculano, as comédias O Conselho das dez, A velhice enamorada sempre leva surriada e a farsa Manuel Mendes Exúndia. Devem-se-lhe também duas mis-
sas, matinas e outros trechos religiosos. A música de Miró, que em 1849 se transplantou
para o Brasil e aqui veio a morrer, está inteiramente esquecida. (1963: 240)”.
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O renomado musicólogo português Ernesto Vieira dá conta que estudou com frei José
Marques e Domingos Bomtempo, iniciando a carreira de artista em 1826, pois foi a 2 de
março deste ano que se “inscreveu na irmandade de Santa Cecília”, para a qual compôs,
em 1829, uma missa a quatro vozes e orquestra para ser cantada na festa da padroeira dos
Este mesmo autor põe em dúvida a data de nascimento de Miró (1815), atentando para
o fato que já dava concertos e compunha música em 1826, portanto com a idade de onze
anos, precocidade que com certeza despertaria a atenção do meio musical da época.
Em 1834 foi ser responsável pela música do Teatro das Laranjeiras do Conde do Far-
robo onde dirigiu uma ópera de Mercadante “a primeira opera que ali se deu n’essa épo-
ca”(VIEIRA:91). Miró foi também maestro no Teatro São Carlos, sendo substituído por
Migoni, em 1843, reassumindo o posto entre 1845 a 1848. Joaquim de Vasconcelos afirma
que António Luiz Miró, em 1836, dirigia o Teatro de São Carlos e que, pelo mesmo ano,
fez representar sua ópera séria Atar. Este mesmo musicólogo informa que mais duas óperas
de sua autoria Virgina e AMarqueza foram encenadas em 1840, sendo bem acolhidas in-
clusive com a Sinfonia de abertura da Marqueza sendo executada à época “com applauso
A sua vinda para o Brasil ocorreu nos finais de 1849 ou início de 1850, após espetácu-
lo em seu benefício. Acompanhou-o a sua “formosa Josephina”, estabelecendo-se no Ma-
ranhão como professor de piano e “director de uma companhia lyrica italiana” (VIEIRA,
Fato curioso, narrado por Vieira, dá conta de que sua curta estadia no Maranhão foi
.resolvendo regressar á Europa para vêr se obtinha melhoras, sahiu do Maranhão para Pernambuco, falleccendo, segundo consta, n’esta cidade em maio de 1853. Uma tradição oral diz que o capitão do navio que o conduzia, vendo-o em estado muito grave e receiando embaraços sanitrios, fe-lo desembarcar em um ponto des-conhecido, antes do termo da viagem, deixando-o ahi abandonado, quasi cadáver (1900: 94).
Renato Almeida (1942:369) destaca que o compositor foi autor de música sacra, ópe-
ras cômicas, comédias, “algumas delas representadas em São Luís”, exercendo o cargo de
mestre de canto e primeiro pianista do Teatro São Carlos, sendo ‘um músico de muita sig-
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nificação em seu país, tendo composto a ópera Os Infantes de Ceuta sobre letra de Alexan-
.inaugurou o Teatro S. Luiz que era o velho União, inteiramente remodelado, com uma companhia dramática, de que fazia parte sua mulher, Josefina Miró. O maestro lusitano teve boa influência na vida cultural do Maranhão e o encontramos, através de uma referência de João Francisco Lisboa, tomando parte na orquestra da famosa festa de N. S. dos Remédios, em 1851. Faleceu em Pernambuco em 1853 (1942:369).
Vai ser José Ribeiro do Amaral, um cronista maranhense, que trará algumas informa-
ções preciosas sobre a passagem de Miró por São Luís.
Antonio Luiz Miró, que nos legou a incomparavel novena de Nossa Senhora dos Remedios, que fazia as delicias dos nossos maiores. Miró foi tambem auctor de va-rias operas, operas-comicas, comedias, algumas dellas representadas aqui. Em 1852, veio ao Maranhão, trazendo consigo, de Portugal, uma boa companhia dra-matica, havendo-lhe sido, por essa occasião, entregue o nosso theatro, que acabava de passar por grandes concertos. Falleceu, em Pernambuco, em Abril de 1853, quando se dispunha a tomar um transatlantico, com destino a Lisboa. Miró era ca-sado e gosava, nesta cidade, de grandes sympathias, devido ao seu trato affavel e polido (1922:297-298).
A sua Novena de Nossa Senhora dos Remédios, composta no Maranhão, é escrita para
solistas (soprano, alto, tenor, barítono e baixo), harmonium, coro e orquestra (flauta, clari-
nete, pistom, trompa, fagote, figle, tímpanos, vl 1, vl 2, vl 3, vl 4, viola, cello e contrabai-
xo), e se encontra resguardada no Acervo João Mohana, com o número de catalogação
0220/95. Esta obra possui no Invitatório, elementos melódicos que foram utilizados na
Introdução de uma obra anterior, o Kyrie da Missa e Credo, um manuscrito pertencente à
Coleção Ernesto Vieira, num claro reaproveitamento do autor, sendo, possivelmente, sua
Obra Musical
A obra musical de António Luiz Miró ainda não foi objeto de estudo descritivo e ana-
lítico, embora esteja presente nos principais catálogos musicais de Portugal. Em sua maio-
ria, está resguardada no Setor de Musicologia da Biblioteca Nacional de Lisboa, em diver-
sos fundos musicais, dentre eles a Coleção Ernesto Vieira e a do Conde de Redondo. O
Quadro a seguir relaciona o material por mim consultado:
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Quadro 1. Listagem das Obras de António Miró Observações
Ofl, Ocl, Otr, Ocor1, Ocor2, Otrb, Otimp
Orgão/ Originalde Antonio Luis Miró/Maio de 1845 Responsórios a 4 que Fundo do
se cantam 6a. f.ra s.ta / Conde de Re- 136.3
companhamento de Órgão de Antonio Luis Miró de 1845 A Vivandeira
Poesia do Sr. Palmei-rim Música de Antonio Luis Miró Ária para clarinete
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postas e dedicadas às suas discípulas por António Luiz Miró O Triumpho de Lisia. Coleção Er-
de trompa extremamente difí-cil, no estylo rossiniano. Curio-so. (Obs. de Vieira)
vorite de G. Donizetti. Suspiro d’Alma. Ro-
violoncelos flauta, clarinette, voz a solo e baixo. 4 de abril de 1846. Partes cavadas.
Música extrahida de differentes operas. Part. completa
um acto. Missa e a 4.Executada Coleção Er-
16 de julho de 1843 Credo. Pertencente à
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Como se pode ver por esse quadro-resumo, a produção musical de Miró abrange vari-
ados gêneros musicais, desde o operístico, passando pelo sacro, sinfônico e camerístico.
Joaquim de Vasconcelos lista nove óperas de Miró entre 1833 a 1844, dentre elas, Atar, ó La Rivolta, dell’ Seraglio, Il Sonambulo, Triumpho de Lysia, Virginia, A Marqueza, Atar,Virginia, Il Sogno del Zingano, Os Infantes em Ceuta. Ernesto Vieira em um artigo no
Diccionario Bibliographico Portuguez faz um descrição do libreto desta ópera, lamentando
Ah! a partitura! a gloriosa partitura! Creio que lhe coube a sorte de muitissimas su-as congeneres. O que eu tenho podido arrebanhar não será a decima milionesima parte do que se tem perdido em materia de bibliografia musical, especialidade mui-to mal fadada entre nós.Aqui ha anos disse-me o Sousa Bastos que a bela Josefi-na, viuva do Miró, caída em extrema pobresa vivia de esmolas. - Conservará ainda algumas obras do marido, perguntei ancioso. - Isso sim, pobre velha, me respondeu Sousa Bastos; ela que não tem um lençol para cobrir-se como ha-de guardar papeis para os ratos roerem (ARANHA, s.d., em formato digital).
O estilo composicional de António Luiz Miró pode ser configurado como adequado ao
gosto corrente da corte lisboeta da primeira metade do século XIX, marcado já pelas “pro-
fundas alterações do tecido social, econômico e político do país provocadas pelo confronto
entre ideologias liberais e conservadoras” (NERY e CASTRO, 1991:118). Essa mudança
de cenário tem como reflexo a crise da composição musical cortesã e o surgimento de uma
intensa atividade teatral com a inauguração, em 1793, da mais famosa instituição operística
de Portugal, o Teatro de São Carlos, que irá surgir como expressão de uma civilização “i-
luminada” amparada por uma influente e emergente classe burguesa (NERY e CASTRO,
Por outro lado, Miró também não descuidou da produção religiosa, compondo Missas, Ofícios, Salmos e Novenas, para as festividades das igrejas lisboetas, em que combina o
estilo antigo, polifônico, com o “estilo moderno”, a utilização de “técnicas originárias da
ópera, do madrigal e da música instrumental profana” (CASTAGNA, 2001:171).
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